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O que é ser Acadêmico Imortal ?

Atualizado: 7 de mai. de 2023

Texto de Rosildo Barcellos.



"Quando estou na cidade tenho a impressão que estou na sala de visita com seus lustres de cristais, seus tapetes de viludos, almofadas de cetim. E quando estou na favela tenho a impressão que sou um objeto fora de uso, digno de estar num quarto de despejo."


Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus



O Brasil conta atualmente, com três mulheres governadoras, todas elas no Nordeste. São elas, Fátima Bezerra (RN), Regina Sousa (PI) e, no último sábado, Izolda Cela (CE). Apesar deste dado, apenas seis estados elegeram mulheres governadoras na história do país.


A ocupação da política com fulcro no pensamento feminino ainda é um desafio neste país. Agora imaginemos sessenta anos atrás. Esse era o cotidiano de Carolina Maria de Jesus que foi uma das primeiras escritoras negras do Brasil e é considerada uma das mais importantes escritoras do país.


Carolina viveu boa parte de sua vida na comunidade do Canindé, em São Paulo, sustentando a si mesma e a seus três filhos como catadora de papéis. Em 1958, teve seu diário publicado sob o nome ‘Quarto de Despejo’, com auxílio do jornalista Audálio Dantas. O livro fez um enorme sucesso e chegou a ser traduzido para 14 línguas.

Carolina construiu sua própria casa, usando madeira, lata, papelão e qualquer material que pudesse encontrar. Saía todas as noites para coletar papel, a fim de conseguir dinheiro para sustentar a família.

Em 1947, aos 33 anos, desempregada e grávida, Carolina instalou-se na extinta favela do Canindé. Foi quando estavam surgindo na cidade de São Paulo as primeiras favelas, cujo contingente estava em torno de 50 mil moradores.


Ao chegar à cidade, conseguiu emprego na casa do cardiologista Euryclides de Jesus Zerbini, médico precursor da cirurgia de coração no Brasil, o que permitia a Carolina ler os livros de sua biblioteca nos dias de folga. Em 1948, deu à luz seu primeiro filho, João José.


Teve ainda mais dois filhos. À noite, trabalhava como catadora e registrava o cotidiano da comunidade onde morava nos cadernos que encontrava no material que recolhia. Carolina conseguiu somar mais de vinte. Um destes cadernos, um diário que havia começado em 1955, deu origem a seu livro mais famoso, ‘Quarto de Despejo:


Diário de uma Favelada’, publicado em 1960.


Após a publicação do livro, Carolina se mudou. Em 1962, ‘Quarto de Despejo’ foi publicado nos Estados Unidos pela editora E. P. Dutton, com o título ‘Child of the Dark’.

Segundo o autor Robert Levine, somente das vendas desta edição, que totalizaram mais de 300 mil cópias nos EUA, Carolina e sua família deveriam ter recebido, pelo contrato original, mais de 150 mil dólares.


Contudo, não foi encontrado indício algum de que ela tenha recebido sequer uma pequena parte disto. Carolina de Jesus morreu aos 62 anos em seu quarto, em Parelheiros, no dia 13 de fevereiro de 1977.


Grande exemplo de mulher e escritora, Carolina Maria de Jesus é um dos maiores nomes da literatura brasileira. Em 14 de março, próximo passado, ela completaria 108 anos de idade e mesmo 45 anos depois da sua partida, continua sendo referência na luta pela igualdade de gênero, de classe e contra o preconceito.


Depois dessa breve introdução histórico-literária, posso responder porque cheguei a Academia de imortais e o que representa o título de Comendador literário. Somos as pessoas que mostram que, através do legado de Carolina e de tantos outros escritores, devemos continuar combatendo o racismo em toda a sociedade.


Afinal as mulheres são múltiplas, de quatro em quatro, elevadas à sua quarta potência, multiplicadas sucessivamente por si mesmas. E a começar por minha mãe, vi com os meus próprios olhos o que significa a superioridade feminina.


Ela ao me ver doente e desfalecido em seus braços, além de estar sem recursos momentaneamente, ofereceu-se para capinar o quintal, do vizinho, para que com quinze cruzeiros, fosse possível eu continuar minha pequena vida.

Vida que me trouxe até uma Academia Literária e Doutor em Literatura, para, justamente eternizar os reais e verdadeiros atos de heroísmo, que são efetivamente realizados peremptóriamente, a cada dia, embora, anonimamente e; sem um “Muito Obrigado”, sem um “abraço”, “ sem um retorno financeiro”; mas que são justamente os atos que sustentam a fé, a razoabilidade, a hombridade, a civilidade, e a racionalidade com a soberania deste país.



Rosildo Barcellos


Articulista, com mais de 1500 artigos publicados e Membro Fundador Imortal da Academia Brasileira de História e Literatura ABHL. Co-autor dos livros Folhas de Plátano, Versos Vivos – Poesia Presente e Poemas a Flor da Pele.

* Texto originalmente publicado no Jornal de Curitiba.

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